Opa, Teuri aqui.

Uma das habilidades mais básicas para o RPG de Mesa é a capacidade de descrever. Fazer boas descrições de ações, cenas, ambientes e qualquer coisa que você possa imaginar, é uma maneira de conectar sua imaginação à imaginação dos outros. Muitas pessoas associam erroneamente a importância dessa habilidade apenas ao mestre de jogo, uma vez que é ele que descreve mais os ambientes. Mas saber descrever bem é uma habilidade que também faz jogadores se destacar.

Minha intenção com o texto de hoje é te passar algumas dicas rápidas que vão melhorar bastante a sua capacidade de descrição, pra você já testar em sua próxima mesa.

Descrever bem, não é descrever muito

Muita gente confunde essas duas coisas. Já vi vários mestres e jogadores que monopolizam o tempo de jogo fazendo descrições muito longas, e se justificando ao dizer que fazem isso porque querem descrever bem. É importante se atentar para o fato de que o RPG de mesa geralmente é um jogo coletivo. Descrições muito longas podem ter o objetivo contrário ao esperado, tirando a imersão das pessoas.

Uma característica única da mídia do RPG de Mesa é o fato de os jogadores poderem interagir com o mundo. Isso não é possível em livros, filmes, séries, etc. Então, minha dica é tentar fazer boas descrições com as técnicas que vamos aprender a seguir, mas deixar espaço para que os outros jogadores possam interagir com aquilo que foi descrito, antes de você descrever mais.

Quando eu mestro, costumo dizer o seguinte: ”As perguntas dos jogadores são os sentidos do personagem: visão, audição, olfato, tato e paladar. Se você pergunta como é o teto, eu entendo que a partir daquele momento seu personagem olhou para o teto, e daí descrevo melhor. Portanto, façam perguntas para explorar o mundo!”

Mas então, qual seria o tamanho ideal para uma boa descrição? Bem, isso é algo que varia em cada mesa, a depender do gosto de cada grupo. Usando a dica anterior, eu geralmente descrevo 3 características básicas de uma cena, criatura ou qualquer coisa do tipo, tentando ser mais breve. A partir daí eu deixo os jogadores explorarem o mundo e fazerem perguntas, e descrevo a medida do necessário.

O mesmo vale para jogadores. Descrevo ações do meu personagem buscando ser mais breve e dando até 3 características, e a partir daí deixo as perguntas do mestre, e outros jogadores indicarem quando preciso descrever mais.

Técnica de Converter Adjetivos

Essa é uma técnica bem simples que criei a vários anos e uso frequentemente em minhas mesas. Na realidade, a técnica em si não foi inventada por mim, eu só criei uma forma rápida de aplicar e pensar nela. No fundo, trata-se de uma técnica muito usada na escrita literária e em roteiros, que é o clássico “Show, don’t tell”. Essa é frase famosa de Hemingway que significa “Mostre, não conte”. A ideia é que uma descrição fica melhor e mais emocionante quando nós mostramos algo acontecendo, em vez de só contar que aquilo aconteceu. Compare as duas descrições a seguir:

O dragão destruiu toda a vila.

Contando

As asas do dragão soam como trovões enquanto ele sobrevoa a vila. Poeira e pedaços de telhado são jogados para o ar. De repente, um jato de fogo engole a praça. O sino da igreja derrete em questão de segundos. Pessoas correm, tropeçando em barris em chamas. Vocês ouvem um choro de uma criança, perdida, até que a cauda imensa derruba a última parede que restava de pé. Quando o rugido do dragão some, só resta cheiro de fumaça e as brasas e cinzas.

Mostrado

Eu fiz um exagero aqui, mas a ideia é demonstrar que na primeira cena, a descrição só conta o que aconteceu, enquanto na segunda ela mostra isso acontecendo. A segunda tende a ser mais imersiva, ao custo de mais palavras.

De modo muito resumido, isso é o que se conhece como “Show, don’t tell”. É um conceito fácil de se entender, mas a aplicação muitas vezes torna-se complexa, e a gente acaba esquecendo. Foi daí que surgi com a Conversão de Adjetivos. Basicamente é um modo rápido de mostrar em vez de contar. A técnica consiste no seguinte:

  1. Pense nos adjetivos para a cena que quer descrever, as qualidades: bonito, feio, cheiroso, frio, quente.

  2. Converta isso para descrições, sem falar o adjetivo em nenhum momento. Em vez de descrever um lugar quente, quais coisas lembram lugares quentes para você?

Simples, né? É importante perceber que as qualidades são subjetivas. Cada pessoa tem uma ideia do que é bonito, feio, etc. Pense no sentido sentido disso pra você, descreva. Deixe com que os outros cheguem as próprias conclusões. Muitas vezes essas conclusões podem ser diferentes da que você esperava, e até te surpreender. Vou dar um exemplo

  • Quer descrever uma casa bagunçada e suja. Vou descrever abaixo tentando converter os dois adjetivos em coisas que me remetem a eles:

Vocês chegam até a casa, e logo sentem o cheiro de mofo e poeira. Tem roupas jogadas pelo chão. Na pia da cozinha, pilhas de louças sujas com restos de comida, que já começam a cheirar decomposição. O ar tá abafado e quente. E por onde vocês passam deixam rastros na poeira que cobria o chão.

Basta praticar e isso por si só já vai melhorar bastante sua capacidade descritiva. É importante lembrar que isso não é um dom, mas uma habilidade que a gente pode treinar e ir melhorando. No começo você vai sentir uma certa dificuldade, mas quanto mais praticar, melhor vai ficar.

Uma dica extra é que você pode inclusive usar a técnica ao inverso, e pedir para os jogadores ou outra pessoa converter para você. Quando mestro, faço isso direto. Eu digo: “Pessoal, vocês chegam em uma taverna animada. Como é esse local?” Isso dá aos jogadores a capacidade de criar o mundo conforme a visão deles.

Lembre-se apenas de tentar usar todos os sentidos na hora da conversão, e de não monopolizar o tempo de jogo com suas descrições.

Técnica da Pirâmide da Abstração

Essa é uma técnica usada e popularizada pelo autor Brandon Sanderson, e eu a conheci em suas palestras sobre escrita no youtube. Basicamente ela também é um jeito de ajudar a aplicar o “Mostre, não conte”.

Imagine uma pirâmide, onde a base representa aquilo que é concreto e o topo representa o que é abstrato.

xToda descrição se encontra em em algum ponto da pirâmide, seja mais alto ou mais baixo. Quanto mais mais alto e mais abstrato, a descrição é mais teórica, mais ampla, e mais aberta a interpretações. Geralmente são descrições mais desconectadas do momento presente, mais filosóficas. Já descrições na parte mais baixas são mais concretas e estão mais ligados ao aqui-agora, sendo menos abertas a interpretações diferentes. Geralmente ações de personagens, acontecimentos na cena, tudo tende a ocorrer mais nesse nível.

Perceba que quanto mais descemos na pirâmide, mais larga e vai ficando. Isso significa que descrições mais concretas exigem mais palavras e tempo, ao passo que as mais abstratas exigem menos. Não existe um julgamento de valor aqui sobre o que é melhor ou pior, são apenas diferentes. O ideal seria mesclar os dois tipos e buscar um equilíbrio, descendo e subindo na pirâmide conforme o necessário.

Acho importante fazer aqui uma melhor sobre o conceito de abstração, que muitas vezes acaba sendo confundido. Veja a frase: “Um cachorro”. Onde você acha que essa descrição se encaixaria na pirâmide da abstração? Muita gente gente a dizer que seria mais voltada para a parte concreta, uma vez que “um cachorro” é um animal concreto que todo mundo conhece. Mas isso seria um erro! Cada pessoa tem uma ideia diferente do que é um cachorro, e exatamente por ser tão comum, cada um pode imaginar um cachorro diferente. Portanto, essa descrição estaria localizada mais no topo da pirâmide. Se eu descrevesse “Um cachorro caramelo filhote, com pelo curto e rabinho balançando”, isso sim traria a descrição mais para a parte concreta da pirâmide.

A ideia geral que o Sanderson passa em suas palestras, é que você deve ganhar o direito de ser abstrato. Isso quer dizer que, primeiro você faz várias descrições mais concretas e estabelece uma base, para só depois começar a subir um pouco mais na pirâmide e fazer mais abstrações, porque as pessoas já estão “ancoradas” naquele mundo.

No fundo, o que a técnica de Converter Adjetivos faz, ao meu ver, é permitir um jeito fácil de descer nessa pirâmide.

Vai Andar de Bicicleta!

Em meu texto anterior aqui na Newsletter, eu comentei sobre como a prática é importante. Não adianta nada assistir tutoriais de como andar de bicicleta durante um ano, pois, se você nunca tiver subido em uma, ao tentar andar pela primeira vez, você vai cair!

Isso se aplica aqui também. A teuria teoria é maravilhosa, mas você só vai perceber todas as nuances e aprender melhor na prática. Então escolha um pedaço pequeno do que você viu aqui e pratique em suas próximas mesas, veja os resultados, analise, e vá modificando para funcionar para você. Eu até tinha feito um curso na hotmart com o título Domine a Arte da Descrição no RPG, e você pode dar uma olhada, caso tenha interesse. Ele também está disponível como vídeo exclusivo para membros no youtube. Mas confesso que preciso dar uma atualizada nele, planos para o futuro.

E aí, gostou desse texto? Tem algum feedback ou comentário? Comente no post no site, vai ser muito legal te ouvir.

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Um grande abraço, e até a próxima!

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